Um lenço de papel no bolso da calça estrategicamente pensado para limpar o nariz dos meus filhos quando descemos para brincar no parque. Algo simples, bobo. Algo que até nem poderia estar mais no meu bolso quando precisei, mas estava.
É possível que algo assim já tenha acontecido, que você tenha guardado algo achando que vai precisar em um momento, mas só fez uso mesmo em outro. Comecei a perceber o quanto isso se assemelha a resposta do amor.
Esse “algo” vai de uma caneta na bolsa até um remédio para aliviar a dor de cabeça de alguém no meio de um trânsito parado.
Confesso que se alguém me pedir é mais fácil que eu supra a necessidade de quem precisa de caneta do que de Dipirona – ou qualquer outra medicação. É natural que sejamos mais precavidos daquilo que para nós é importante. E eu acho que se tivéssemos mais canetas do que comprimidos na bolsa, seríamos mais saudáveis.
Mas, já parou para pensar o que providencialmente você tem em mãos? Ou quais são as coisas que você prioriza que não falte? Sabe aquelas que estão sempre contigo dentro da bolsa? As respostas são muito parecidas com o que para você é um “kit de primeiros socorros”.
A verdade é que enquanto somos solteiros e sem filhos nossas prioridades são outras, bem diferentes, pelo que essa fase exige.
Eu digo exige porque concordo com o que Clarice Lispector fala sobre o amor ser exigente. “O amor, em vez de dar, exige “, disse ela. E isso é verdade.
Se os meus filhos não estivessem doentes e com nariz escorrendo a cada respirada, eu não iria colocar um pacote de lenço no bolso da calça só para descer pro parquinho.
Algumas mães podem ir super preparadas. Tem outras mães que nem pro parquinho vão— os filhos estão com as suas babás. Eu acho que me encaixo no meio termo – e acho que isso é bom. Eu enxergo se é uma necessidade e aí eu levo, mesmo que eu não vá usar.
É o amor— o cuidado pra não deixar que o nariz escorra e eles espalhem toda a secreção pelo rosto, porque pra eles o mais importante é brincar — que me faz lembrar de pegar o pacote de lenço e colocar no bolso.
O que o amor te faz lembrar? Ou melhor, o que você esquece porque te falta amor?
Quando os filhos nascem nossas prioridades se reorganizam por amor, por exigência. O amor que exige levantar na madrugada para amamentar. O amor que exige a observação das necessidades. O amor que exige a paciência quando é a terceira vez no mesmo dia que seu filho joga água no chão. O amor que exige troca de fraldas. O amor que lá na frente vai exigir acolhimento quando estiverem sem rota. O amor que hoje exigiu que eu saísse com lenço no bolso.
E eu levei. Brincamos bastante e ali no meio da ventania e de tanto sorriso que se capturava de relance, mas não precisei ser lembrada do pacote de lenços. Quando se trata de crianças necessidades não são necessárias sempre, mesmo que sejam necessidades, tipo plano de saúde.
É quase impossível os dois filhos estarem doentes e a mãe que fica muito tempo com eles não adoecer também. Horas depois de subir do parquinho, eles já estavam dormindo e eu estava tentando aproveitar o tempo para estudar e senti meu nariz querendo escorrer. Imediatamente pensei: sim, o amor exige, mas se a gente não cobra a ele pelo esforço que fizemos, ele nos devolve outra hora de alguma forma, extraordinária ou mesmo ordinária.
Nem precisei levantar, não perdi o pouco tempo que tinha para estudar, o amor se fez presente, levei minha mão até o meu bolso e usei os lenços.